domingo, 31 de julho de 2011

O multiculturalismo e sua farsa, no registro de Alon Feuerwerker


Em sua coluna de hoje no jornal Correio Braziliense, o jornalista Alon Feuerwerker traz interessante e oportuno texto sob o título "Farsa intelectual", para debate do público - em especial dos seus leitores, certamente -, sobre o multiculturalismo("o manejo da diferença em nossas sociedades", bem genericamente), que há tempos é assunto mundial, e principalmente um tema europeu - acadêmica e popularmente falando, digamos assim, pois na ordem do dia da cidadania continental -, mas que também interessa a americanos do Norte, do Centro e do Sul, e particularmente aos da Sulamérica, esta onde nós brasileiros nos situamos com os nossos vizinhos e as nossas relações, bi e multilaterais, a cada dia mais amplas e intensas, conforme matéria de capa do mesmo diário que discorre sobre a imigração no país, com chamada nada modesta, embora bem atual e verdadeira para muitos: "O SONHO DE SER BRASILEIRO".

Para apontar e demonstrar jornalísticamente a pretendida "farsa intelectual", em seu texto o eminente colunista do Correio Braziliense foca, inicial e centralizadamente, no "maluco de Oslo", como mundo afora uns tantos passaram a chamar Anders Behring Breivik, o frio assassino local de mais de sete dezenas entre jovens e adultos noruegueses, na grande maioria originários da própria Noruega - o país que anualmente organiza e confere o Prêmio Nobel da Paz ao "ungido da vez" -, embora alguns deles fossem "árabes" ou descendentes.

Mas como acontece no plano da realidade, na coluna de hoje o autêntico democrata e assumidamente judeu Feuerwerker(sim, brasileiro de origem judaica, igualmente a outros admiráveis jornalistas deste país, do nosso tempo e de ontem, como o saudoso Samuel Weiner) os confronta - "árabes" e "ocidentais" -, e dali produz uma argumentação terrível e inescapável, ao afirmar o óbvio a quem não é cego: "A guerra pelo spot de vítima tem uma base lógica, porque o multiculturalismo para todos seria, no limite, completamente disfuncional. Para a sobrevivência de alguma civilização, uns precisariam ter mais direito ao multiculturalismo que outros."

À situação acima vislumbrada, ainda apenas hipotética mas não impossível de ser transformada em tragédia pela história, que sempre arma/nos apronta das suas, Feuerwerker ilustra com uma sequencia de exemplos e cogitações que, não por culpa dele, beiram ao paroxismo, como os seguintes: a)-"No Brasil, por exemplo, tolera-se que índios matem seus filhos portadores de deficiência. É olhado como traço cultural a respeitar. Por que são índios"; b) -"E se olhássemos os atos do maníaco de Oslo pelo ângulo do multiculturalismo? A conclusão seria aterradora. Em vez de simplesmente condenar, estaríamos obrigados a "tentar entender".

No texto, Feuerwerker chega à hipótese do "maníaco de Oslo", dessa última transcrição, após a seguinte cogitação "dos índios que matem[matam] seus filhos portadores de deficiência": "É capaz de o mesmo sujeito uma hora criticar, justamente, os governantes de incapazes de providenciar acessibilidade e outra defender o indígena cuja cultura autoriza matar crianças deficientes." Como outros, mais um paradoxo bem possível em nosso tempo.

Logo no íncio da década passada - no ano 2001, precisamente -, quando ao meu pedido a AGU me destacou, por um período, para atuar junto à Procuradoria da Funai, me deparei com situações como a "dos índios que matem[matam] seus filhos portadores de deficiência", e outras similares. Não cheguei a fazer a defesa de nenhuma aberração moral(sim, e não nos esqueçamos da remota Esparta, na defesa da eugenia para a sua gente e os seus exércitos, ainda paradoxalmente sacralizada, mesmo que de forma submersa, no imaginário coletivo) dessa magnitude - ainda que, como advogados, desafios dessa ordem possam ser postos em nossos horizontes -, embora naquele tempo lá se falasse de monstruosidades similares, que apenas o multiculturalismo poderia tolerar, contemporizar... Isso não foi o que determinou o pedido que apresentei para retornar à Procuradoria da Previdência(INSS), mas foi o que fiz.

Lá se vai quase uma década que estou distanciado das questões indígenas e previdenciárias - agora faço apenas a defesa da "viúva" na área de pessoal, junto à AGU e ao Poder Judiciário da própria(a União, claro, por suas instituições indiretas) -, mas destas ainda guardo minha própria experiência, num só tempo acadêmica e opercional, sobre multiculturalismo, quando, no já relativamente distante ano 2000 terminei por publicar, pela COMEPI - Companhia Editora do Piauí, a obra "Acordos Internacioanis no Âmbito da Seguridade Social"(agora fora do mercado, mas com exemplares nas principais bibliotecas públicas de Brasília; Rio de Janeiro...), livrinho de aproximadamente 200 páginas em que eu, apresentando os acordos do Brasil na área e seguindo um autor do porte do renomado francês Marcel Merle(Socilogia das Relações Internacionais, Editora da UNB), vislumbrei a "questão internacional dos migrantes", que então tinha apenas um forte viés racial, mas hoje também tem o religioso, principalmente na Europa, com uma ostensiva, ou às vezes velada rejeição aos muçulmanos.

Para "O SONHO DE SER BRASILEIRO", que é a matéria de capa da edição de hoje - 31/07/2011 - do "Correio Braziliense", apesar de aqui e ali despontar um ou outro registro de intolerância - burra, cruel e covarde, em qualquer tempo e lugar -, felizmente ainda não temos, e provavelmente não teremos problemas da magnitude que os migrantes se deparam mundo afora, inclusive muitos dos nossos patrícios. E é por isso que as fronteiras do Brasil, em especial com os seus vizinhos, sempre os atraía, hoje mais que ontem, por óbvio e justificável, em busca de uma vida melhor, que é o que geralmente move o migrante.

A questão do multiculturalismo como farsa, que ora é destacada no texto insuspeito, e autêntico em suas idéias, do Alon Feuerwerker(meu contemporâneo no Movimento Estudantil, quando da luta nacional pelo restabelecimento do Estado Democrático de Direito e na Reconstrução da UNE - em especial durante o ano de 1979, na Bahia, embora não nos conheçamos pessoalmente, pois ele estava como líder em São Paulo e eu líder lá no Piauí), no entanto, permanece, e por isso deve ser encaminhada e resolvida logo mais - e que não seja tarde -, de forma inteligente e democrática - o que não é fácil, mas indispensável -, para que a mesma não se transforme em mais uma armadilha da história e de suas tramas, principalmente pelos dois lados agora em confronto e que até aqui já produziram, de parte a parte, tipos como Bin Laden e Anders Breivik.

quarta-feira, 27 de julho de 2011

Investimento estrangeiro no Brasil bate recorde. Imaginem se o Estado brasileiro não trabalhasse contra o Brasil...


Matéria publicada hoje no jornal "O Estado de São Paulo" traz a informação de que a "...entrada de investimentos estrangeiros diretos - voltados para o setor produtivo - atingiu no primeiro semestre a marca recorde de US$ 32,5 bilhões, a mais alta desde o início da série histórica do Banco Central (BC), em 1947. Em seis meses, a entrada de recursos superou o volume de ingressos anuais de toda a série, com exceção de quatro anos, e cobriu, com folga, o déficit das contas externas brasileiras."

Para avaliação desses dados, não faltam analistas, palpiteiros..., de todas as origens e vocações, exaltando ou condenando a conjuntura econômica, quando não indiferentes, mas a verdade é que, por força de fatores externos - e essa é talvez a mais forte - ou não, o Brasil vive momento similar à experiência de 1947 - como registrado na mesma matéria do "Estadão" -, ano seguinte ao da "restauração democrática" ocorrida em 1946, quando se pôs fim, "efetivo", ao 15 anos da "Ditadura Vargas", ou, ainda ao triste ano de 1971, há exatos 40 anos, quando vivíamos em plena ditadura militar, e no ápice dos "anos de chumbo", sob a "batuta" do general Médice, o então plantonista da Presidência, responsável pela maior repressão vivida em nossa história republicana no século XX - os meus 13/14 anos, no Colégio Diocesano da então pequena Teresina não me deixam esquecê-la -, mas também pelo nosso maior índice de crescimento econômico de todos os tempos - 11,6% -, festejado aqui e lá fora, ao ponto de quase "legitimar" a ditadura.

Agora imaginem se ao invés dessa quadrilha que domina as estruturas políticas do Estado brasileiro, e que por isso mesmo vive trabalhando contra o Brasil - ao contrário do que se propala, interna e externamente -, tivéssemos um outro Estado Democrático de Direito guiado pela transparência efetiva e verdadeiramente comprometido com o interesses nacionais, de mais Democracia e República. Os Estados Unidos, a China e outros "grandões" logo logo estariam tremendo nas bases, com o justificável receio de perda de mercado e outras perspectivas a lhes tomar o sono.

No entanto, para os virtuais concorrentes/desafiantes do Brasil, perda de sono, e muito menos a cogitação de possíveis pesadelos são hipóteses improváveis nas perspectivas dos mesmos, que aqui podem contar agora com novos aliados, à direita e à esquerda, a começar pelos jovens e velhos corruptos que a última pariu no poder, passando pelos extremistas e histéricos da "causa ambientalista", com as mais diversificadas alianças feitas dentro e fora do país, além daqueles velhos inimigos de sempre, incrustados na primeira.

Apesar de tudo e de todos, o Brasil segue o seu destino de nação democrática e vitoriosa na luta contra esses desafios menores, que somente buscam apequená-la e dificultar a sua presença no mundo, como historicamente aspira o seu povo.

terça-feira, 26 de julho de 2011

O ópio, no capítulo 18

“... a fé religiosa não é uma experiência íntima e superior do ser humano, algo único e transcendental... Penso que é apenas uma mentira, a maior de todas as mentiras, na medida em que o destinatário de sua grande inverdade não é exclusivamente o próximo, como acontece com as outras mentiras, mas também, e principalmente, aquele que a guarda consigo. Ainda assim, não se pode condenar esse mentiroso, na medida em que essa mentira pode ser indispensável, e até mesmo vital, para um determinado indivíduo, tanto quanto para a grande maioria da humanidade, que não viveria sem ela. Nem assim, tal mentira deve ser colocada moralmente acima da fantasia ordinária, muito menos distante do delírio dos loucos,
e, no entanto, ao contrário da loucura destes, é aceita e recepcionada pelo senso comum como se fosse uma condição absolutamente normal do ser humano, que, ao contrário daquilo que se concebe dentro dos parâmetros e princípios da racionalidade, julga anormal e inferior, sob
vários aspectos, quem não a tem e nem a pratica”. (O ÓPIO, Capítulo 18, pg.___)

sábado, 16 de julho de 2011

No Brasil, o binômio de sempre: política e corrupção

Láurence Raulino(*) Ontem, hoje e desde sempre no Brasil, política e corrupção é um binômio que não sai do noticiário, por qualquer meio, e com destaque na grande mídia, que informa, repercute e sensacionaliza essa que, óbvio, é uma associação não originária daqui, porém, como o futebol, fez escola em nosso país. Além disso, seja como farsa ou tragédia, é muito antiga - desde que o mundo é mundo, usando da expressão popular -, e cá entre nós ganha ares de verdadeira característica nacional, ainda que conte com praticamente uma irrestrita e visível rejeição da sociedade, exceção óbvia de certos grupos, os associados desse binômio, que aumentam a cada dia, a cada governo que entra, em todas as esferas da (in)governabiliade, nos três poderes e planos federativos.

O caso mais recente de corrupção noticiado na mídia foi o escândalo(?) de corrupção no Ministério dos Transportes do "Governo Dilma", mais um que vai se somar a outros desse governo que mal começa e a tantos e tantos outros de governos passados, ao longo de nossa história, em especial de nossa história recente, o que leva muitos a desacreditar na/da política, a "nobre arte" pensada e refletida pelo grande Aristóteles, que até caracterizou o ser humano pela mesma, quando o identificou com a própria, embora dela hoje parece que queremos fugir..., como se recusássemos a identificação aristotélica, coisa que acontece não apenas no Brasil, mas mundo afora, e isso ninguém ignora.

E já que não podemos mesmo nos livrar da política, pois nem nas ditaduras a mesma deixa de existir - de um jeito bem pior até que nas democracias, como sabemos todos, os que não querem sofrer de enganos -, nos resta pensar em modos e alternativas para ao menos diminuir a sua constante e crescente associação com a corrupção, essa praga que sugere caracterizá-la, pois jamais parece abandoná-la, para deixá-la prosperar livre e em sua feição nobre e cívica, como a via o grande filósofo grego.

Na democracia, que ainda é o melhor de todos os meios para se praticar a política, a propósito de modos e alternativas para se diminuir a corrupção, essa que como àquela é da natureza humana(como muitos outros aspectos que nos fazem menos virtuosos do que gostaríamos), há o remédio da transparência, cada vez mais transparência, real e eficaz - embora não infalível -, que é a melhor de todas as formas de controle que pode existir para o enobrecimento da política.

Efetivamente, com a transparência é possível alcançarmos a virtude na política - não, isto não é ingenuidade, claro, mas uma perspectiva posta em nosso horizonte -, como um dia fizeram os gregos antigos, embora eles tenham sido também, muitas vezes, vítimas da demagogia, mesmo quando exercitavam a sua invejável democracia direta, real e efetiva, ao contrário dessa que, em nossos dias, tentam nos fazer acreditar, pois apenas construída por grupos e interesses manipuláveis, sob a denominação simplória de participativa, que se apresenta em nome da maioria.

Mas, então, se pretendemos a prevalência da virtude na política, nós temos que propiciar os meios adequados para que a nobre arte se manifeste virtuosa, como ensinava outro grande filósofo - não apenas na política, mas na própria vida -, o alemão Emanuel Kant: para que a virtude se manifeste tem de haver liberdade, esta que a primeira e a fundamental das condições objetivas para a manifestação daquela - a virtude.

Porém, com esse sistema político esdrúxulo e "facilitador" da corrupção e das manipulações mais maquiavélicas que existem hoje no Brasil não pode haver qualquer possibilidade, concreta e efetiva para a manifestação real e duradoura da virtude cívica na arte da política. Pensar ao contrário, tomando como exemplo vagos e raros casos de lideranças honestas e responsáveis, que se apresentam aqui e ali, e com base nas mesmas clamar angelicalmente por moralidade..., vem ser a mesma coisa que imaginar isso factível em uma penitenciária brasileira ofertando à sociedade cidadãos exemplares, lá ou quando a deixam.

Portanto, sem mais ilusões, comecemos a criar oportunidades e nos ponhamos a acelerar as mudanças indispensáveis ao nosso sistema político e aos seus fundamentos, com foco em mais transparência e democracia, sempre..., diretrizes que se colocam cada vez mais como antídoto à corrupção.

Sabemos que o desafio da mudança é difícil em qualquer área, mas na política é muito mais, e mais ainda em nossa política. No entanto, podemos mudar, e na verdade já vimos mudando - apesar de todas os paradoxos e contradições à nossa frente -, há tempos, desde que começamos a enfrentar o regime ditatorial e partimos para construir a nossa democracia, que não é das melhores do mundo, porém é a que temos. O que não podemos é nos conformar com a mesma e nesse conformismo "virar as costas" para a política, quando não aceitando a realidade como irreversível, descrendo ou cinicamente.

Todavia, em nossa determinação de mudar a política não poderemos embarcar na primeira aventura que se nos apresente, como certas lideranças que experimentamos no passado recente ou na forma de propostas aventureiras como essa de financiamento público de campanha, posta dentro desse monstrengo de Reforma Política que querem nos impor. Não, isso não.

Financiamento público de campanha apenas para as eleições dos nossos Juízes - que devem ser legitimados pelo voto da cidadania, dentro do modelo que vem sendo debatido dentro e fora do parlamento, como eu defendo, abertamente - , mas não para a dita "classe política", infelizmente composta pelos mais diversificados e nefastos interesses. Assim, para os políticos, ao contrário do que sustento para os juízes, ainda deve permanecer o financiamento privado, e com muita fiscalização, que é dever do Estado.

O financiamento privado das campanhas políticas deve ser mantido, portanto, mas com indispensável e rigorosa fiscalização - não essa que hoje é feita pela Justiça Eleitoral, óbvio. Do contrário, como iremos justificar para o povo, que sofre com os piores descalabros na educação, na saúde, na segurança e com a moradia, que estaremos retirando verba dessas áreas para destinar àqueles que amanhã poderão ser "fichas-sujas"? Isso, para pensarmos o mínimo.

Eh, finaciamento público de campanha apenas para os juízes, logo mais, como venho defendendo. Ali é outra história, outro nível, e até refletirá, certamente, numa melhor seleção de quadros para os outros dois poderes, via partidos políticos, muitos desses cada vez mais antros da pior corrupção que se possa imaginar. E não seria o financiamento público de campanha que iria acabar com isso - que o diga o provável artifício do "caixa 2", que sobreveveria.

Outro dia voltarei ao assunto do binômio "política e corrupção", inescapável para a cidadania ativa e consciente, aqui no Brasil ou em qualquer país que trilha os caminhos do desenvolvimento, como o nosso. (*) - advogado, articulista e escritor

terça-feira, 5 de julho de 2011

O Poder Judiciário do Brasil é ilegítimo!


Os princípios democráticos e republicanos que permeiam a "Carta Política" do Brasil não transitam pelo nosso Poder Judiciário, que vive numa espécie de "redoma", completamente distante do povo - apesar de tentar fazer parecer o contrário, "jogando para a platéia" -, que não o elege, como bem ou mal se faz com os outros dois poderes - o Executivo e Legislativo, contrariando, assim, a própria Constituição da República Federativa do Brasil, na qual encontra-se o seguinte princípio: "Todo poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, ..."(art.1º, parágrafo único/CF). Desta regra democrática e republicana, que institui os dois únicos meios legítimos de exercício do poder e que vem ser a alternativa política ao exercício direto do próprio poder pelo povo - como no plebiscito e no referendo - o Poder Judiciário não foi excluído, mas não o observa.

Ou seja, no Poder Judiciário, que não passa pelo crivo das urnas e pelo voto da cidadania, a "representação" do povo na qual referido poder estaria investido é mera peça de ficção jurídica, sem qualquer sustentação nos planos da ordem democrática e republicana. A vitaliciedade de seus membros, então, o ápice da redoma que o afasta do povo, ademais de ser uma herança da Monarquia - coisa de reis, imperadores e da nobreza, assim, uma peça esdrúxula e ridícula, portanto, para os nossos dias -, foi reproduzida e fundida com o que há de pior no modelo constitucional dos Estados Unidos para a sua Suprema Corte, da qual copiamos a nossa e a projetamos para as instâncias inferiores.

Dali, a transitoriedade do poder, que é o principal fundamento do regime democrático e republicano, não se faz presente no Poder Judiciário do Brasil, o que leva os nossos juízes a viverem distantes do povo, embora fazendo demagogia aqui e ali, numa espécie de "jogo para a platéia", para adquirir a legitimidade que lhe falta, por não passar pelo crivo das urnas, pelo voto livre e consciente da cidadania. E o concurso público, isoladamente, não basta, muito menos as "indicações" políticas para as Cortes.

Com efeito, posto que a representação eletiva do Poder Judiciário é uma exigência ampla e irrestrita - para os tres poderes - da própria Carta Política e dos fundamentos democráticos e republicanos que a sustentam, os juízes brasileiros devem passar pelo crivo das urnas, pelo voto livre e desimpedido da cidadania, mas sem qualquer participação de partidos políticos nesse "jogo democrático" especial: no lugar dos mesmos partidos políticos e de suas convenções, o concurso público de provas e títulos, seguido da aprovação no estágio probatório, os dois requisitos básicos para a candidatura de qualquer juiz em manter-se no exercício transitório e sempre renovável de um mandato - que poderá ser de 9, 10, ou 12 anos... - na Magistratura, da primeira instância ao Supremo Tribunal Federal.

Na Proposta de Emenda à Constituição Nº526/2006, de autoria do ilustre procurador federal Carlos Mota, ex-deputador federal pelo PSB/MG - uma proposição legislativa feita em parceria com este articulista, e que ora encontra-se arquivada na Câmara dos Deputados, aguardando que um ou mais dos 173 parlamentares que a subscreveram, ou outro que chegou agora, com coragem, determinação e iniciativa a desarquive, para aperfeiçoá-la, no sentido democrático e republicano - estão delineados os princípios aqui debatidos, brevemente.

Depois de votada e aprovada, aquela PEC ou qualquer outra iniciativa similar e coerente com os fundamentos da Carta Política, o Poder Judiciário do Brasil, dali em diante deixará de ser um poder ilegítimo(por esse ângulo, estaria radical e literalmente desautorizado de julgar qualquer criminoso, inclusive o Fernadinho Beira-Mar), sem qualquer base democrática e republicana, em sua origem, como sempre foi, desde o Império; e continua sendo

domingo, 3 de julho de 2011

O direito à fé


O ser humano vive e pratica a religião desde tempos imemoriais, nos mais diferentes lugares e regiões da Terra, e a ciência, em seus diversos campos de atuação, mas especialmente com o conjunto de estudos desenvolvidos nas áreas da antropologia, da biologia e, inclusive, da história, com destaque, nos explica a origem, as justificativas e as razões daquele - ou seja, nós mesmos - em ainda voltar-se para algo que há pelo menos tres séculos vem sendo diariamente desmontado no confronto da fé com o conhecimento produzido nas academias e em seus labortórios, o qual, no entanto, não explica tudo, hoje. E o que seria explicar tudo, hoje?

A origem do universo e da própria vida, especialmente, seriam duas das principais indagações que desafiam o nosso conhecimento, na verdade adquirido não apenas há 300 anos, mais ou menos, óbvio, mas ao longo dos séculos. De fato, hoje a ciência ainda não tem respostas definitivas ou conclusivas - e talvez nunca as terá - sobre estas duas indagações, que se misturam e se confundem com outras que lhes seguem, ou antecedem, e que seriam mais diretamente de ordem metafísica e de outras áreas da filosofia e do saber, a exemplo daquelas que nos faz perguntar: Por que o universo e a vida foram criados? Por que a humanidade existe, tal como é? Na vida, nós temos uma missão ou não?

Mesmo que a ciência avance a cada dia, hoje dando respostas a/para indagações que ontem não as tinham, é razoável supormos que para muitas perguntas sempre faltarão respostas. À religião, no entanto, ao contrário da ciência, sempre haverá respostas a/para toda e qualquer indagação, face à mesma ter a fé como base de tudo, e para a fé basta acreditar; não é necessário que exista prova, a mínima que seja, do ponto de vista da racionalidade e da explicação que a tenha por base e processo, aquele desenvolvimento típico que nos leva a uma conclusão, momentaneamente definitiva ou não.

Dali, em nosso tempo, igualmente ao que ocorria no passado, aquele remoto ou o mais recente, para grande parte da humanidade basta a fé explicando do fenômeno mais complexo ao mais trivial, seja da vida ou da natureza como um todo. Existem também aqueles que recorrem à fé e à ciência, alternativa ou simultaneamente, os quais talvez se constituam na maior parte da humanidade. Para uma parcela menor da mesma humanidade, no entanto, apenas a ciência atende às suas indagações, e da mesma aguardam a resposta futura - ou não -, quando, no presente, àquelas faltar a resposta cabível ou pertinente.

Grosseiramente falando, então, quanto à religião e à ciência o mundo estaria dividido entre crentes e ateus, sendo estes os que não acreditam em Deus nem na existência de um mundo espiritual, digamos assim, ao contrário dos primeiros, que ainda compõem a incontestável maioria da humanidade. Entre os dois extremos há nuances, com destaque para os agnósticos, que vem ser uma categoria intermediária, e talvez por isso tão atormentada, em muitos casos, quanto muitos dos crentes mais fervorosos, esses pelas mais diferentes "razões", ao ponto de não poucos serem fanáticos.

Mas ali, naquela "divisão", ou "divisões", há também um aspecto relevante e que diz respeito aos que acreditam em Deus e/ou e um mundo espiritual, os quais, efetivamente, se encontram dividos por suas crenças, constituídas pelas mais diversas religiões. Assim, como se sabe, não há apenas a religião, ou uma religião, mas várias, inclusive muitas em guerra ou convivendo lado a lado, mundo afora.

Com os que não acreditam em Deus ou em um mundo espiritual, digamos, assim, não existem as diferenças e as nuances que caracterizam a religião, ou as religiões: na prática e efetivamente todos são ateus em um mesmo e único grau, menos os agnósticos, que não são ateus, rigorosamente, claro; estão na/em dúvida.

No patamar de desenvolvimento conquistado pela humanidade, apesar de suas colossais insuficiências materiais, éticas e morais, principalmente, todas produzidas por paradoxos e contradições sem conta, o ateu, por outro lado, ao tempo em que possa ser considerado alguém com um grau de consciência maior em relação aos que acreditam em Deus e/ou em um mundo espiritual, não se desobriga de considerar e respeitar o direito à fé, toda e qualquer fé, que ainda é professada pela maioria, sob pena de amanhã ter contra si uma hipotética acusação de violar o inalienável direito à mesma fé, além de ser novamente vítima da fúria religiosa, enlouquecida e transtornada, como vista no passado e mesmo em nossos dias, entre as próprias religiões, no Oriente asiático e em muitas regiões da Europa e da África.

Com o uso intensivo e massivo da internet em nossos dias, no Brasil e mundo afora, por outro lado, vimos assitindo a insinuação daquilo que amanhã poderá se apresentar como uma nova fúria religiosa, desta feita entre jovens ateus e crentes, que debatem fé e ateísmo na rede mundial de computadores. Mas o ateu deve respeitar o crente - e isso venho falando na internet, especialmente nas "redes sociais" -, tanto quanto o crente deve respeitar o ateu, que também tem o seu direito de assim ser, qualquer que seja a sua profissão, condição social e opção de vida, etc. É o que impõe a ética, a moral e a civilização, que se mantém por ambas e pelo direito.

Numa palavra, e sem trocadilho de qualquer natureza, o direito à fé é juridicamente "sagrado", e embora assim não o seja o direito a ser ateu, por uma razão intrínseca e opcional, óbvio, este igualmente deve ser havido de forma similar. E aqui, sem querer provocar, por conta de minha transparência e plena convicção, cabe fazer um registro final: Eu acho que no fundo de sua mente e do seu coração - que o último também o tem, como qualquer ser humano, ao inverso do que pensam alguns crentes - nenhum ateu tem prazer em ser o que é. Porém, esta é uma condição de quem não foge da verdade e não fantasia sobre o nosso destino: o nada. Mas o direito de "fantasiar" sobre o destino - céu ou inferno, como no cristianismo, por exemplo -, ou, antes, sobre a nossa presença no mundo não pode nem deve ser "roubado" por nenhum ateu.