sexta-feira, 26 de agosto de 2011

Os juízes nascidos no Século XXI estarão "aposentados" com menos de 40 anos


Láurence Raulino(*)

Em janeiro de 2003 - apenas há 8 anos, portanto -, a extinta Revista da Procuradoria-Geral do INSS(ainda nos acervos das bibliotecas públicas de Brasília e de algumas capitais, sendo que na primeira, inclusive, nas da Câmara dos Deputados; do Senado; da AGU; do STF e dos tribunais superiores) publicou um ensaio de minha autoria, sob o título "O processo e suas perspectivas com as novas tecnologias", no qual, ao examinar algumas das imensas possibilidades de aplicação da informática e dos seus softwares no mundo jurídico, eu vislumbrei a proximidade de uma realidade futura - e plenamente plausível, desde então -, no Brasil e demais países, em que, tanto os processos administrativos, quanto os judiciais, mas principalmente os últimos, logo iriam dispensar a mediação humana, feita há séculos - sim, literalmente... -, como ainda hoje, ao menos na pessoa de um juiz singular - sendo um processo judicial, óbvio, e no âmbito do Poder Judiciário, portanto -, para apenas receberem a literal e efetivamente célere decisão de Sua Excelência o Computador-Juiz(ou Juiz-Computador). Delírio?

No Brasil, particularmente - onde foco o meu ensaio -, ali pelos idos de 2002/2003..., o ainda relativamente insatisfatório processo virtual do mundo jurídico, tal como o conhecemos hoje, não passava de uma temerária ousadia teórica - posto que, ao tempo em que era condenado, de antemão, pela insegurança que se vislumbrava ali, já sofria pelas ineficiências técnicas, na fase primária de estudos e testes, que depois seriam superadas, em muitos pontos... -, pois os computadores e os softwares no máximo se constituíam em/de suportes para o acompanhamento dos processos judiciais físicos(de papel) nos Juízos singulares e colegiados. E hoje, primeiro ano da segunda década do Século XXI?

Desde março de 2007, com o advento da Lei nº11.419/2006, entramos, no Brasil, na fase da informatização da Justiça, e hoje o processo judicial virtual já é uma realidade, ainda com muitas falhas e deficiências, mas a caminho de excluir o juiz e toda a imensa, lenta e caríssima máquina judiciária, tal como essa se nos apresenta, da secular - ou seria milenar? -mediação dialética e da consequente decisão buscada, nos autos - sim, nos autos, agora também eletrônicos - pelas partes, sejam estas as particulares ou até o próprio Estado, que é o maior de todos os litigantes em nosso país.

Esse processo de exclusão do julgador humano da mediação dialética e da decisão buscada pelas partes, e que a segue - ambas no âmbito dos autos judiciais -, no entanto, para ser totalmente concluído talvez ainda irá demorar de uma a duas décadas, pelo menos, e afora os grandes desafios técnicos, éticos, morais..., que ainda devem ser vencidos, a resistência corporativa - representada e integrada não apenas pelos juízes, mas por toda a estrutura da máquina judiciária, e isso não é fenômeno exclusivamente brasileiro, claro, e sim mundial - é a principal razão, entre todas, daquela presumida demora, porém, com essa natureza não é e nem será a única, certamente. Advogados, partes..., além de inúmeros outros pontos de resistências, que certamente partirão dos mais diversos interesses e áreas da própria sociedade, concorrerão para o adiamento daquela aventada e desejável exclusão, isto por tudo de positivo que a mesma trará por meio da redução de bilhões e bilhões de reais que passarão a ser economizados com a manutenção, despendida atualmente e pelos próximos anos, nessa monumental máquina burocrática, e que dali passarão a ser destinados à educação; à saúde; à promoção da cultura e do lazer...

Se dirá, alhures, que a suposta economia acima aventada seria nada mais que um grande equívoco, se efetivada a cogitada exclusão humana do mundo jurídico - no concernente à mediação dialética; de condução da produção probatória, e, por fim, da decisão buscada pelas partes e pela sociedade, digamos assim -, porquanto o custo da mesma seria transferida da máquina "predominantemente humana" para a "máquina predominante eletrônica/virtual". Aí, ledo engano, ou simples má fé, pois nem um custo da máquina virtual vislumbrada, por mais alto que venha ser, jamais poderá ser comparado ao estrondoso custo com os subsídios dos juízes e dos seus auxiliares - R$6.000.000,00(seis bilhões de reais), conforme os próprios, na presente mobilização para mais uma greve, e isso apenas no âmbito da União; dos promotores e procuradores, e respectivos auxiliares, etc.

O problema maior dessa equação, no entanto, prende-se ao aspecto inevitável de que o Estado não poderá deixar de pagar, do dia para a noite, digamos assim, subsídios/salários de juízes e respectivos auxiliares; subsídios/salários de procuradores, promotores e respectivos auxiliares, óbvio. Afora isso, ainda restarão as aposentadorias de todos, que igualmente devem ser pagas, até à morte de cada um, inescapavelmente.

No fim das contas, somando-se tudo..., dali resultará a mais absurda e injusta sustentação do ócio pela sociedade, nos próximos anos, pois se a exclusão possível da mediação humana, como plausível, se efetivar, sem procrastinação, mesmo por etapas, como vem sendo..., no máximo em duas/três décadas - se tanto... -, os novos juízes do Século XXI, ou seja, os nascidos de 2001 em diante e que estarão ingressando na magistratura com 25/26 anos, ou seja, lá pelo ano de 2026/2027, poderão se aposentar antes dos 40 anos, valendo dizer, com "menos de 15 anos de casa", pois, à vista do que hoje já é plausível, poderão ir para casa..., já que nos foros e nos tribunais nada mais lhes restará para fazer, a não ser ficar em seus gabinetes, a navegar na internet..., ou passear pelos corredores vazios daqueles prédios públicos.

(Aqui abro um parêntese para registrar um aspecto gravíssimo, ao inverso do que é propalado aos quatro quantos, sobre a "falta/carência de juízes", no âmbito do Poder Judiciário brasileiro. Em recente pronunciamento sobre a reivindicação da Justiça do Trabalho em ampliar os seus "quadros", a ministra Eliana Calmon, Corregedora Nacional de Justiça, protestou contra essa iniciativa da "justiça laboral", e ali demonstrou com números atualizados e idôneos, que as demandas trabalhistas estão sendo reduzidas dia a dia, pelo que seriam desnecessários novos concursos para Juíz do Trabalho, etc).

É estarrecedor toda a plausibilidade desse quadro - reconheço -, mas hoje é o que o futuro nos aponta, ou não? Assim, se não quisermos encará-lo com ilusões e fantasias, ou irresponsabilidades, como de hábito, mas, ao contrário, com visão estratégica e responsabilidade cívica, devemos começar a fazer isto agora. Já!

(*) - advogado público, articulista e escritor
(http://www.procurador-raulino.com.br)

quinta-feira, 25 de agosto de 2011

ASPECTOS HUMANOS DO DUQUE DE CAXIAS

Manoel Soriano Neto(*)


1.Considerações Iniciais
Muito já se disse a respeito do Duque de Caxias. Entretanto, traços humanos personalíssimos e aspectos singulares da edificante existência do ínclito Soldado merecem ser rememorados. Assim, apresentaremos alguns registros, dignos de nota, relativos ao Homem - Caxias; à sua audácia nos campos de batalha; ao resgate de sua memória e às principais homenagens que lhe foram tributadas.Tal é o objetivo dessas despretensiosas achegas, alinhavadas em apertada e incompleta síntese.
2.O Homem - Caxias
a. Luiz Alves de Lima e Silva pautou a sua vida pela inteireza de caráter, arrojo, acendrado patriotismo, fervorosa religiosidade e inexcedível exação no cumprimento do dever.
Caxias possuía estatura acima da média para a sua época (quando trasladado, em 1949, para o Panteão em frente ao Ministério da Guerra, no Rio de Janeiro, na Ata de Exumação constou que o esqueleto media 1,72m); de compleição atarracada, ombros largos, olhos castanhos, cabelos castanho-alourados, tez clara e rosada, voz suave, sisudo, garboso, austero, de hábitos morigerados, rigorosíssimo no cumprimento do dever, porém humano, saudável, apesar de padecer de uma malária contraída no Maranhão, que lhe causava a inchação do fígado; era orgulhoso de sua formação militar, corajoso, determinado, sedizente fatalista, o que também explica a sua invulgar temeridade, maçon dedicado, pai extremoso e “cristão de fé robusta”.
b. O Coronel José de Lima Carneiro da Silva, neto de Caxias, entrevistado, aos 83 anos, pela revista “Nação Armada” (n° 23, Out 1941), disse em certo trecho da entrevista: “O Duque, após o passamento da Duquesa, jamais tirou o luto, mesmo em casa. Era, entretanto, alegre e se alimentava bem, preferindo à mesa, pratos da culinária gaúcha. Apesar de fluminense, o Rio Grande do Sul era a sua menina dos olhos. A toda hora falava das suas coisas, dos seus homens e tinha mesmo um certo sotaque de riograndense do sul. A música encantava-o, como velhas mazurcas e valsas, tocadas ao piano por sua comadre Maria José, que ele ouvia em silêncio, fumando grandes e perfumados charutos. Era um inveterado fumante de charutos, consumindo vários por dia.”
c. Caxias trouxe do Paraguai, três cavalos: “Moleque”, “Douradilho” e “Aedo”. Um dos biógrafos do Duque, o Dr.Vilhena de Moraes, nos dá conta da seguinte reminiscência: “Ao fogoso “Douradilho”, da ponte de Itororó, Caxias, já velho e enfermo, costumava melhorar a ração na data do aniversário daquele combate (6 de dezembro)”...
d. Quando da concessão da anistia aos vencidos, ao término da Revolução Farroupilha, aflorou, sobejamente, o sentimento de generosidade do “Pacificador”. Ele concedeu a liberdade aos cativos farroupilhas, incorporando os que assim desejassem ao Exército Imperial, e tratou com extrema bondade os derrotados, sendo escolhido, pelos próprios gaúchos, para Presidente da Província e por eles indicado para Senador pelo RGS. Não apenas por isso, o saudoso jornalista e acadêmico Barbosa Lima Sobrinho, concedeu-lhe a notável honorificência de “Patrono da Anistia” e o eminente historiador militar, Coronel Cláudio Moreira Bento, o cognominou de “Pioneiro Abolicionista”.
e. Ainda com referência à grandeza de espírito de Caxias, observe-se, em seu Testamento, como está expressa uma de suas vontades: “Declaro que deixo ao meu criado Luiz Alves, quatrocentos mil réis e toda a roupa de meu uso”. Diga-se que esse criado era um índio que ele trouxera, ainda jovem, do Maranhão, após a Balaiada, adotando-o e dando-lhe o próprio nome; ressalte-se que ele foi a primeira pessoa lembrada, no dito Testamento, no qual, somente ao depois, são mencionados familiares e amigos íntimos do venerando Marechal...
f. Seria despiciendo falar-se do exacerbado patriotismo do Duque de Caxias. Mas gostaríamos de encerrar essas breves considerações atinentes à figura humana desse exponencial personagem de nossa História, relembrando um trecho de uma carta por ele escrita ao Visconde do Rio Branco, ao tempo da “Questão Christie”, de dolorosa memória, e que bem evidencia o seu acrisolado amor ao Brasil: “Não se pode ser súdito de nação fraca. Tenho vontade de quebrar a minha espada quando não me pode servir para desafrontar o meu País, de um insulto tão atroz”.
3. A audácia de Caxias nos campos de batalha
a. A intrepidez de Caxias revelou-se em inúmeros episódios, nos quais o intimorato Comandante não se furtou a correr o “risco calculado”. A sorte, entretanto, sempre o acompanhou nos momentos de alta periculosidade. É que ele “tinha estrela”, tanto que a “grande estrela de Caxias” apareceu com fulgurante brilho, nos céus do Rio Grande do Sul, quando de uma de suas ofensivas noturnas contra os farroupilhas (era, na realidade, o cometa “Brilhante”), a respeito da qual dizia Caxias, em tom zombeteiro, mas alimentando, com sagacidade, a crendice popular em torno de sua pessoa: “É, eu nasci na Vila de Estrela, no Rio de Janeiro”...
b. Caxias era, de fato, extremamente arrojado, como se pode constatar em várias oportunidades de seu historial castrense, desde Tenente a General. Extraordinária foi a sua valentia na Guerra da Independência e na Campanha da Cisplatina, tendo o jovem Tenente e Capitão recebido encomiásticas referências por sua coragem e desprendimento. Saliente-se, outrossim, a sua ousadia, quando do combate de Santa Luzia (MG); no reconhecimento, em 1852, do porto de Buenos Aires e, máxime, na Guerra do Paraguai. Quando do maior conflito bélico de que participamos, o Generalíssimo executou audaciosas manobras como a de envolvimento e cerco, em conjunto com a Marinha, e que redundou na queda da “inexpugnável” Fortaleza de Humaitá; como a “marcha de flanco” empreendida pelos nossos três Corpos de Exército através de uma estrada, de cerca de 11 km, construída sobre o Grão-Chaco e as operações da “Dezembrada”, no começo das quais se travou a memorável batalha de Itororó. No fragor dessa refrega, o Marquês de Caxias, aos 65 anos de idade, parte em direção à ponte sobre o arroio Itororó, sabre em punho e a galope de carga, após bradar: “Sigam-me os que forem brasileiros!” (consigne-se que o marcial apelo do Comandante-em-Chefe era tão-somente anímico, ao sentimento de brasilidade, posto que apenas tropas brasileiras participaram da batalha).
4. O memorável resgate da memória do Duque
a. Quando da trasladação dos restos mortais de Caxias e de sua esposa, em 25 de agosto de 1949, para o “Pantheon Militar”, defronte ao hoje Palácio Duque de Caxias, no Rio de Janeiro, ocorreu um fato histórico singular, muito pouco lembrado, infelizmente. É que, naquela data, se deu o definitivo resgate da memória do Duque de Caxias, que tantos e tamanhos serviços prestara à Pátria Brasileira, na paz e na guerra. Mas tal resgate foi apenas um magnífico epílogo de um justo desagravo e da recuperação da imagem do Duque, o que já vinha ocorrendo, especialmente a partir de 1923, como adiante faremos referência.
b. Caxias morreu, no ano de 1880, triste e magoado. A tristeza se devia ao falecimento, em 1874, de sua amantíssima esposa, tendo ele usado luto completo, desde então até morrer, seis anos depois. Três pungentes mágoas o afligiram no final da vida e diziam respeito ao Imperador, à Maçonaria e à Igreja Católica.
O Duque encontrava-se agastado com o Imperador, desde quando concedera, com a relutância de D. Pedro II, em 1875, a anistia aos Bispos de Pernambuco e do Pará, solucionando, de forma magnânima, a chamada “questão religiosa”. Após o retorno de uma longa viagem à Europa, o Monarca destituiu o Gabinete Conservador, presidido por Caxias, nomeando um outro, com membros do Partido Liberal. O velho Soldado, assaz desgostoso, recolheu-se à Fazenda Santa Mônica, de propriedade de uma de suas filhas, onde viria a falecer, em 8 de maio de 1880, afastando-se, definitivamente, da vida pública.
O Decreto de anistia aos Bispos, nunca foi aceito pela Maçonaria. O Visconde do Rio Branco, Grão-Mestre da Ordem, solicitou demissão do Conselho de Ministros, a fim de não assinar o dito Decreto, rompendo com o seu grande amigo Caxias, “Irmão que se tornou altamente impopular entre os da Arte Real”, pelo que o Marechal deixou de freqüentá-la.
Ademais, a Igreja Católica exigiu que o Duque, provecto e doente, cumprisse os ditames de uma bula papal e abjurasse a Maçonaria. Como ele não obedeceu àquela determinação religiosa, foi expulso, por ser “maçon pestilento”, da Irmandade da Cruz dos Militares, da qual fôra Provedor...
Acrescente-se que a figura de Caxias, desde os últimos anos da Monarquia, vinha sofrendo duras críticas, desferidas por profitentes do Positivismo. Os positivistas, que tiveram decisiva participação na proclamação da República, eram pacifistas e, por isso, menosprezavam os gloriosos feitos marciais do Império, dos quais o nosso “Soldado-Maior” foi o expoente máximo.
c. Porém, naquele agosto de 1949, toda a Nação Brasileira reparou as injustiças e ingratidões perpetradas contra o Duque, quando do traslado de seus despojos e os da Duquesa. A histórica Solenidade cívico-militar, presidida pelo Presidente da República, Marechal Eurico Gaspar Dutra, revestiu-se de superlativo brilhantismo, sendo o presidente da Comissão de Trasladação, o Dr. Nereu Ramos, Vice-Presidente da República, que era um fiel maçon. Membros da Família Imperial Brasileira e o Marechal Rondon, tradicional positivista, estiveram presentes à cerimônia, que se encerrou com um monumental desfile militar. Aduza-se que a Igreja Católica velou os restos mortais de Caxias e os de dona Ana Luíza, na Igreja da Irmandade da Cruz dos Militares, que o havia expulso, em 1876, sendo concelebrada uma Missa por 18 Bispos e Arcebispos, de todos os rincões brasileiros, presenciada pelo Cardeal do Rio de Janeiro, Dom Jaime de Barros Câmara. E mais: houve um dobre de sinos, em todas as igrejas católicas do Brasil, na hora da trasladação....
Destarte, em 25 de agosto de 1949, ocorreu, de fato, uma memorável reparação histórica da altaneira imagem de um dos maiores filhos desta Pátria, o Duque de Caxias.
5. Principais homenagens tributadas a Caxias
a. Caxias, “Nume Tutelar da Nacionalidae”, foi tudo! Marechal do Exército, Conselheiro de Estado e da Guerra, Barão, Conde, Marquês, Duque, Presidente e Pacificador de Províncias, Senador (pelo RS), Deputado (pelo Maranhão, eleito, mas não empossado), três vezes Ministro da Guerra e três vezes Presidente do Conselho de Ministros! E o Brasil soube reconhecer os beneméritos serviços por ele prestados à Pátria – “nossa Mãe-Comum”. Por esses “brasis” existem incontáveis monumentos, logradouros públicos, escolas, etc, que ostentam o augusto nome do maior vulto militar da História do Brasil. Dentre essas honrarias, sobrelevam-se as denominações de duas importantes cidades: a de “Duque de Caxias”, no Rio de Janeiro, e “Caxias do Sul”, no Rio Grande do Sul (diga-se, por ilustrativo, que a cidade de Caxias, no Maranhão, onde o então Coronel Luiz Alves venceu o último foco dos rebeldes, quando da “Balaiada”, deu origem ao seu primeiro título nobiliárquico – o de Barão de Caxias).
b. Caxias foi instituído, no ano das festividades do duocentenário de seu nascimento, mediante a Lei n° 10.641, de 28 Jan 2003, “Herói da Pátria”. Por isso, o nome do Herói foi inscrito no “Livro dos Heróis da Pátria” (é um grande livro de aço que se encontra no Panteão da Liberdade e da Democracia, em Brasília), por ocasião de bela cerimônia ocorrida em frente ao Quartel-General do Exército, na Capital Federal.
c. No Exército Brasileiro, a impoluta memória de Caxias começou a ser reabilitada de um semi-anonimato (ao qual foi relegada pelo sectarismo positivista-republicano), em 1923, pelo Ministro da Guerra, General Setembrino de Carvalho. Ele instituiu, pelo Aviso n° 443, de 25 de agosto de 1923, a “Festa de Caxias”. Posteriormente, por meio do Aviso n° 366, de 11 de agosto de 1925, o mesmo Ministro criou o “Dia do Soldado”, também a ser comemorado na data natalícia do Duque. Naquele ano de 1925, sob o influxo das diretrizes do Ministro da Guerra, a Turma de Aspirantes-a-Oficial da Escola Militar do Realengo escolheu a denominação histórica de “Turma Duque de Caxias” (aliás, a Turma de 1962, da Academia Militar das Agulhas Negras, à qual pertence o atual Comandante do Exército, General de Exército Enzo Martins Peri, também ostenta, com muita ufania, a denominação de “Turma Duque de Caxias”).
Outro momento histórico de grande relevância no enaltecimento de Caxias, pela Força Terrestre, se deu por ocasião do comando do então Coronel José Pessoa Cavalcanti de Albuquerque, na Escola Militar do Realengo (1931/4). Este militar, de elevadíssimos méritos, implantou, naquela Escola, várias místicas alusivas a nosso glorioso passado, sendo as maiores delas a instituição do título de “Cadete”, para os então alunos da Escola, e a criação do espadim, réplica do invencível sabre do “Condestável do Império’ e “Unificador da Pátria”.
O Duque de Caxias foi proclamado “Patrono do Exército”, consoante o Decreto n° 51.429, de 13 de março de 1962.
O glorioso e invicto Exército do qual ele é Patrono, possui as seguintes Organizações Militares que exibem o seu venerável nome, com indescritível orgulho, em suas denominações históricas: “Forte Duque de Caxias”, no Rio de Janeiro (RJ); “Batalhão Barão de Caxias”, que é o 24° Batalhão de Caçadores, de São Luís (MA); “Grupo Conde de Caxias”, que é o 3° Grupo de Artilharia Antiaéreo, de Caxias do Sul (RS); “Companhia Praça Forte de Caxias”, que é a 13ª Companhia de Comunicações, de São Gabriel (RS) e o “Batalhão Duque de Caxias”, que é o Batalhão da Guarda Presidencial, de Brasília (DF).
6. À guisa de Conclusão
Impende lembrar, por derradeiro, neste breve escorço referente a aspectos pouco lembrados da mui grandiosa gesta e da personalidade do Duque de Caxias, de que certa e recerta é a intemporalidade das inúmeras lições que ele nos legou!
Finalmente, desejaríamos trazer à lembrança, como corolário de tudo o que até aqui foi expendido, uma expressão, - “caxias” -, cunhada pelo saudoso e emérito sociólogo Gilberto Freyre, que bem retrata o caráter adamantino e as peregrinas virtudes de nosso insigne “Soldado e Pacificador”. Tal expressão, uma metáfora caída na consagração popular, bem caracteriza aqueles que cumprem, integral e rigorosamente, os seus deveres. Disse Gilberto Freyre: “Caxiismo não é conjunto de virtudes apenas militares, mas de virtudes cívicas, comuns a militares e civis. Os “caxias” devem ser tanto paisanos como militares. O caxiismo deveria ser aprendido tanto nas escolas civis quanto nas militares. É o Brasil inteiro que precisa dele”...

(*) - Cel Ref, Historiador Militar, ex-Chefe do CDocEx.

Os juízes nascidos no Século XXI estarão aposentados com menos de 40 anos




Em janeiro de 2003 - apenas há 8 anos, portanto -, a extinta Revista da Procuradoria-Geral do INSS(ainda nos acervos das bibliotecas públicas de Brasília e de algumas capitais, sendo que na primeira, inclusive, nas da Câmara dos Deputados; do Senado; da AGU; do STF e dos tribunais superiores) publicou um ensaio de minha autoria, sob o título "O processo e suas perspectivas com as novas tecnologias", no qual, ao examinar algumas das imensas possibilidades de aplicação da informática e dos seus softwares no mundo jurídico, eu vislumbrei a proximidade de uma realidade futura - mas plenamente plausível, desde então -, no Brasil e demais países, em que, tanto os processos administrativos, quanto os judiciais, mas principalmente os últimos, logo iriam dispensar a mediação humana, feita há séculos, como ainda hoje, ao menos na pessoa de um juiz singular - sendo um processo judicial, óbvio, e no âmbito do Poder Judiciário, portanto -, para apenas receberem a literal e efetivamente célere decisão de Sua Excelência o Computador-Juiz. Delírio?

No Brasil, particularmente - onde foco o meu ensaio -, ali pelos idos de 2002/2003..., o ainda relativamente insatisfatório processo virtual do mundo jurídico, tal como o conhecemos hoje, não passava de uma temerária ousadia teórica - posto que, ao tempo em que era condenado, de antemão, pela insegurança que se vislumbrava ali, já sofria pelas ineficiências técnicas, na fase primária de estudos e testes, que depois seriam superadas, em muitos pontos... -, pois os computadores e os softwares no máximo se constituíam em/de suportes para o acompanhamento dos processos judiciais físicos(de papel) nos Juízos singulares e colegiados. E hoje, primeiro ano da segunda década do Século XXI?

Desde março de 2007, com o advento da Lei nº11.419/2006, entramos, no Brasil, na fase da informatização da Justiça, e hoje o processo judicial virtual já é uma realidade, ainda com muitas falhas e deficiências, mas a caminho de excluir o juiz e toda a imensa, lenta e caríssima máquina judiciária, tal como essa se nos apresenta, da secular - ou seria milenar? -mediação dialética e da consequente decisão buscada, nos autos - sim, nos autos, agora também eletrônicos - pelas partes, sejam estas as particulares ou até o próprio Estado, que é o maior de todos os litigantes em nosso país.

Esse processo de exclusão do julgador humano da mediação dialética e da decisão buscada pelas partes, e que a segue - ambas no âmbito dos autos judiciais -, no entanto, talvez ainda vá demorar de uma a duas décadas, pelo menos, e afora os grandes desafios técnicos, éticos, morais..., que ainda devem ser vencidos, a resistência corporativa - representada e integrada não apenas pelos juízes, mas por toda a estrutura da máquina judiciária, e isso não é fenômeno exclusivamente brasileiro, claro, mas mundial - é a principal razão, entre todas, daquela presumida demora, mas, com essa natureza não é e nem será a única, certamente. Advogados, partes..., além de inúmeros outros pontos de resistências, que certamente partirão dos mais diversos interesses e áreas da própria sociedade, concorrerão para o adiamento daquela aventada e desejável exclusão, isto por tudo de positivo que a mesma trará por meio da redução de bilhões e bilhões de reais que passarão a ser economizados com a manutenção, despendida atualmente e pelos próximos anos, nessa monumental máquina burocrática, e que dali passarão a ser destinados à educação; à saúde; à promoção da cultura e do lazer...

Se dirá, alhures, que a suposta economia acima aventada seria nada mais que um grande equívoco, se efetivada a cogitada exclusão humana do mundo jurídico - no concernente à mediação dialética; de condução da produção probatória, e, por fim, da decisão buscada pelas partes e pela sociedade, digamos assim -, porquanto o custo da mesma seria transferida da máquina "predominantemente humana" para a "máquina predominante eletrônica/virtual". Aí, ledo engano, ou simples má fé, pois nem um custo da máquina virtual vislumbrada, por mais alto que venha ser, jamais poderá ser comparado ao estrondoso custo com os subsídios dos juízes e dos seus auxiliares - R$6.000.000,00(seis bilhões de reais), conforme os próprios, na presente mobilização para mais uma greve, e isso apenas no âmbito da União; dos promotores e procuradores, e respectivos auxiliares, etc.

O problema maior dessa equação, no entanto, prende-se ao aspecto inevitável de que o Estado não poderá deixar de pagar, do dia para a noite, digamos assim, subsídios/salários de juízes e respectivos auxiliares; subsídios/salários de procuradores, promotores e respectivos auxiliares, óbvio. Afora isso, ainda restarão as aposentadorias de todos, que igualmente devem ser pagas, até à morte de cada um, inescapavelmente.

No fim das contas, somando-se tudo..., dali resultará a mais absurda e injusta sustentação do ócio pela sociedade, nos próximos anos, pois se a exclusão possível da mediação humana, como plausível, se efetivar, sem procrastinação, mesmo por etapas, como vem sendo..., no máximo em duas/três décadas - se tanto... -, os novos juízes do Século XXI, ou seja, os nascidos de 2001 em diante e que estarão ingressando na magistratura com 25/26 anos, ou seja, lá pelo ano de 2026/2027, poderão se aposentar antes dos 40 anos, valendo dizer, com "menos de 15 anos de casa", pois, à vista do que hoje já é plausível, poderão ir para casa..., já que nos foros e nos tribunais nada mais lhes restará para fazer, a não ser ficar em seus gabinetes, a navegar na internet..., ou passear pelos corredores vazios daqueles prédios públicos.

(Aqui abro um parêntese para registrar um aspecto gravíssimo, ao inverso do que é propalado aos quatro quantos, sobre a "falta/carência de juízes", no âmbito do Poder Judiciário brasileiro. Em recente pronunciamento sobre a reivindicação da Justiça do Trabalho em ampliar os seus "quadros", a ministra Eliana Calmon, Corregedora Nacional de Justiça, protestou contra essa iniciativa da "justiça laboral", e ali demonstrou com números atualizados e idôneos, que as demandas trabalhistas estão sendo reduzidas dia a dia, pelo que seriam desnecessários novos concursos para Juíz do Trabalho, etc).

É estarrecedor toda a plausibilidade desse quadro - reconheço -, mas hoje é o que o futuro nos aponta, ou não? Assim, se não quisermos encará-lo com ilusões e fantasias, ou irresponsabilidades, como de hábito, mas, ao contrário, com visão estratégica e responsabilidade cívica, devemos começar a fazer isto agora. Já!

quarta-feira, 24 de agosto de 2011

O adeus





Mick Barros


O que pensar quando a morte aparece e leva mais uma vida? E quando essa vida se vai pelo uso indiscriminado de drogas, álcool e afins? É nisso que tenho pensado deste a morte da Amy, pois pra mim a morte dela foi à síntese da morte de milhões de jovens que estão perdidos, tentando ou não, lutar contra o vício.

Eu gostava da Amy, gostava da voz, das músicas, do look anos 50. Como todo ser humano ela em algum momento quis fugir da dor e procurou nas substâncias ilícitas a cura para seu mal. Atire a primeira pedra quem nunca se rendeu a subterfúgios para conseguir ficar mais feliz e esquecer a sua condição humana. Nós somos assim, seres eternamente insatisfeitos e temos a necessidade de sublimarmos a realidade para nos sentirmos um pouco melhores.

Pra mim não existe uma grande diferença entre a Amy Winehouse e o pivete que fuma crack no centro da cidade, ambos estão doentes, ambos procuram algo que a sociedade não está conseguindo suprir. Alguns poderão me dizer: “Mas ela tinha dinheiro, tinha o dom, tinha escolha”. Isso é verdade o caminho dela poderia ter sido mais fácil, poderia ter sido diferente, mas quando a droga entra a sua capacidade de escolha zera, sua automonia vai embora e como a palavra mesmo se define você fica dependente.

Infelizmente mais um talento se foi, como tantos outros, conhecidos ou não, e a nós resta refletir: Aonde isso tudo irá nos levar? E o que fazer para que a droga não acabe com as novas gerações? Ela se foi. E quantos mais irão acompanhá-la?

segunda-feira, 22 de agosto de 2011

Justiça veta outdoor considerado homofóbico em Ribeirão Preto. É certo?!



O juiz errou em sua decisão, violando a lei, e a Lei Maior do Estado brasileiro, que é a própria Constituição, na qual encontra-se assegurada a liberdade de crença, ou seja, de fé..., de religião. Recorrendo, a parte prejudicada - uma "igreja evangélica", ao que parece -, referida decisão será cassada, ou tornada sem efeito.

Gostando ou não o "movimento gay", com todo respeito que lhe é devido, trata-se, o cartaz/outdoor, de mero exercício da liberdade religiosa - também de expressão, tão sagrada quanto...-, que não poderia ser tolhida pelo Estado brasileiro, por um de seus três poderes, no caso o judiciário.

O que a igreja evangélica e nem ninguém pode fazer é atacar fulano ou beltrano por ser homossexual - dirigindo-lhe imprecações, com palavras que atinjam/afrontem sua honra, etc. No entanto, a igreja ou outra instituição pública - sim, mas nunca estatal -, bem como e especialmente qualquer um cidadão pode diluir seu desapreço de forma coletiva, indeterminada pessoalmente, valendo dizer, pode atacar o próprio movimento gay. Sim, isso pode, como se pode também - padres, pastores... - pregar nos púlpitos e nos altares contra o homossexulaismo.

Agora, extrair da bíblia, como no caso, uma expressão que segue em contrário aos interesses do homossexualismo, do movimento gay..., não pode ser ato proibido. Proibido deve ser proibir esse direito dos crentes.

Isso aí que o juiz de Ribeirão Preto fez contra a igreja evangélica é um precedente extremamente perigoso no Estado Democrático de Direito, que é laico - sim, é laico, inescapavelmente laico, embora "Deus"(qual, ou que Deus?) seja invocado no preâmbulo da Carta Política -, mas protege todas as crenças e as descrenças. Isso aí que o Estado fez - embora seja uma decisão recorrível - foi "promover transitoriamente" o inverso da homofobia, numa bizarra forma de homoFÉbia. Não pode, data venia.

Assim, embora respeitando os direitos dos homossexuais, eu defendo o direito dos evangélicos, e de quaisquer outros crentes exercerem a sua fé, mesmo que contrária àqueles, tudo conforme deixei bem claro em meu artigo "A "questão gay" e os sectarismos que a permeiam, de parte a parte", publicado em meu site(www.procurador-raulino.com.br), no site da revista eletrônica "Âmbito-Jurídico"(do Rio Grande do Sul), e no CONJUR - Consultor Jurídico(de SP), quando do "entrevero" entre o Bolsonaro e a Marinor, nos corredores do Congresso.

E vejam que defendo os evangélicos, ou quaisquer outros grupos de crentes, mesmo eu sendo descrente, ou seja, um cidadão que não acredita em "vida espiritual"("vida além desta", pois, ao modo tradicional sou ateu, como dizem), embora eu seja heterossexual - veja que essa luta é travada, reciprocamente, pela fé contra os homossexuais -, mas também nada tenho contra os gays, e amanhã poderei também defendê-los, como agora defendo os evangélicos.

O meu compromisso, na verdade, é apenas e fundamentalmente com a liberdade, e este deve ser também o compromisso de todo cidadão responsável e consciente, especialmente do brasileiro, que, apesar de todas as contradições e dos paradoxos existentes em nosso país, ainda vive em uma democracia.

sábado, 20 de agosto de 2011

Arte x Religião(literalmente, arte versus religião)




A arte e a religião constituem-se em diferentes modos de expressar a consciência e a inconsciência da mente racional - e haveria outra, efetivamente, além desta, seja tangível ou intangível àquelas duas "antagonistas"? - , mas ambas "seriam" quase irmãs gêmeas, por assim dizer, pois praticamente nasceram juntas, ainda durante a longa..., a "eterna noite" dos milhões de anos da pré-história humana. Nesta, desde já anote-se que faltava-lhe a precedência solar, por óbvio, como a Antiguidade Clássica em relação à Idade Média e o seu milênio, ademais de aquela nos impor daqui a consolidada certeza de inexistirem quaisquer perspectivas que não as da barbárie e de sua terrível rotina, numa sensação contínua de algo sombrio e interminável..., ao juízo moderno.

Na "escuridão" barbárica da pré-história, com efeito, a arte e a religião "teriam" nascido como se gêmeas fossem, lá expressando buscas e sensações idênticas às transferidas aos nossos ancestrais civilizados, dos quais as mesmas nos foram transmitidas, contínua ou descontínuamente, pelos mais diversificados, flexíveis ou inflexéis meios que a história registra, isso no decurso de quase cinco mil anos de civilização. Porém, ao menos desde a Renascença, aquela suposta origem comum, embora seguida sempre de comprovada relação ancestral entre a arte e a religião - ao ponto de ambas ainda serem apresentadas, com base numa ou noutra investigação/pesquisa desenvolvida aqui e ali, como "gêmeas" ou "quase-irmãs" -, não impediu que fosse instalada uma incessante exposição reveladora de suas contradições e incompatibiliades, num processo que a cada dia se amplia e se aprofunda.

Com efeito, aos olhos das mais variadas áreas do conhecimento e da informação, digamos assim, há anos e anos a arte e a religião deixaram de ser vistas como "gêmeas", ou "quase-gêmeas", para se distanciarem uma da outra, quando vistas em suas reais perspectivas, ainda que consideradas as origens remotíssimas e comum de ambas, pois legadas à história pela mais longínqua pré-história que se possa visualizar do ser racional que vem produzindo aquela - ou seja, a história. E quanto às suas reais perspectivas, quais seriam aquelas que distanciam arte e religião?

Ora, de forma direta e sem meias palavras, a religião é caminho de fuga da realidade, seja esta através daquela via mais alta que possa haver ou pela mais baixa, mas inescapavelmente na forma de alienação, valendo dizer que a religião se presta "ao conforto espiritual" do sofredor primário e desesperado ou daquele que simplesmente busca transceder, tão-somente, mas por um ou outro modo de caminhar, o trânsito de fuga da realidade, e a sua consequente alienação se perfazem. Ao contrário da religião, a arte é caminho de encontro, de prazer e contemplação da beleza. Eis, portanto e respectivamente, apenas duas de algumas outras perspectivas de ambas que distanciam a arte da religião, desde sempre.

Porém, no "mundo ocidental e cristão", por exemplo - mas não apenas nele, claro -, desde a origem do cristianismo - e mesmo nos seus antecedentes, conforme "as escrituras" - que a arte foi empregada como suporte da religião, e não é preciso ir muito longe para se ilustrar essa verdade, pois ali estavam os cânticos, a poesia, a pintura, a escultura..., todas compondo em maior ou menor grau aquilo que se convencionou chamar de "arte sacra". No entanto, a rigor, isso não era e nunca foi realmente arte, a menos que se queira considerá-la "arte enganjada", tomando-se emprestado a expressão recente, embora já bem decadente, do que houve com a "arte política", de triste memória.

Há de se concluir, portanto, neste brevíssimo e despretensioso ensaio, com a mais pura honestidade e sem maiores ou menores ilusões, que bastam as considerações acima para se vislumbrar hoje - e desde sempre -, que a arte verdadeiramente expressada, de um lado, como de outro a religião - esta posta em seu lugar real e sem disfarces -, embora reconhecidamente originárias da mesma pré-história humana, e talvez simultaneamente, jamais poderiam, ou poderão ser confundidas, pois expressam realidades e perspectivas completamente distintas, e tanto quanto a água e a gasolina, nunca poderiam, ou poderão ser confundidas, eis que são opostas e inconfundíveis.

sexta-feira, 19 de agosto de 2011

O tubarão e o mar








Láurence Raulino(*)



Quando eu era apenas um filhote,
o destino na noite se perdeu..., se equivocou;
quase cego, e sem ter à mão nem um archote,
não viu..., não enxergou!

Dali, então pensou:
"À minha frente todos são peixinhos."
A verdade, portanto, lhe escapou;
e na escuridão, nos supôs iguais, pois pequeninhos.

No entanto, peixe eu não era; nunca fui.
Não desses postos em pequenos aquários
pois sou um tubarão, e no mar ataco: ui!!!
Mas aqui vivo preso, igualmente aos otários.

Porém, antes de eu morrer;
mas bem longe de partir para o nada...
penso em deixar de sofrer,
e nadar no mar, a minha morada.

Sendo tubarão de água doce e salgada, e sou o de cabeça-chata
viajo pelos maiores rios e no oceano, o grande mar.
Embora nos rios eu seja logo visto, e ali dizem: mata!
Não, amanhã não é para eu morrer, mas para eu nadar.

Neste pequeno aquário onde fui posto
para viver igual a um peixinho, como todos à minha volta
eu não entrego os pontos e aparento gosto...
Mas qualquer dia desses virá a minha revolta.

Quando eu puder fazer e acontecer
partirei daqui voando - vapt, vupt... - , logo ao amanhecer
determinado, e diretamente rumo ao mar
pois embora aqui, não sou um peixinho, e aquele é o meu lar.

Enquanto não chega a hora..., o instante de partir
me ponho incessantemente..., dia e noite a pensar:
por que justo aqui eu tinha que vir?
Sim, se eu não sou deste aquário, mas desde sempre do mar?

No entanto, aqui há muito tempo estou
vivendo bem/mal limitado e mediocrimente
neste pequeno espaço, pois o destino..., errado pensou:
"Ele é apenas um peixinho, fraco e sem mente."

Fosse dia, e não noite, da maior escuridão
quando ao meu encontro veio o tal destino
outra idéia ele teria feito daquele pequenino.
E então lhe teria ocorrido: - Ah, é um tubarão!

Fatídico encontro, aquele maldito
que privou da vida natural, um tubarão
confundido com um peixinho, bem pequenito
e aqui, em desgosto, não vejo a hora de ir pro meu marzão.

Se logo o mar é impossível, mesmo para um tubarão feroz,
como todos os de minha espécie; os de cebeça-chata,
antes de cair no oceano, do aquário pularei e nadarei pelo rio, até à foz,
donde se pode avistar água salgada, a que deu a vida, mas a muitos mata.

O certo é que aqui neste aquário
não tenho dúvida de que não mais poderei ficar,
perdendo o resto da vida, como um otário
quando tenho pleno certeza de que o meu destino é o mar.


(*) - advogado, articulista e escritor.

sábado, 13 de agosto de 2011

A Íris do Olho da Noite

 

Posted by Picasa

A Íris do Olho da Noite – décimo - primeiro livro de Menezes y Morais – é, sobretudo, um romance de ideias, uma história de amor bem-sucedido, sem pieguice, sentimentalismo, entre um casal liberal – ele economista, ela professora – que tem dois filhos pré-adolescentes. São personagens nascidos em Brasília (DF), cenário geográfico onde a trama acontece. É a partir da lógica e da ótica desse casal bem-resolvido que o enredo do romance agrega ação e inquietação dos demais personagens que compõem os fios da teia narrativa. Dentro da estrutura ficcional do romance tem um livro de poesia; e metade das personagens atendem pelos nomes de Homem, Mulher, Pai, Mãe, Filho.

As demais personas atendem pelos nomes normais, reais, como o poeta Cassiano Nunes e o compositor Renato Matos, homenageados pelo Autor, resgatando uma tradição literária de Dante Alighieri em A Divina Comédia e o brasileiro Jorge Amado. A estrutura narrativa de A Íris do Olho da Noite dispensa o travessão no diálogo interativo das personagens; elas discutem e questionam algumas das questões vitais da humanidade, como sexo, drogas, ética, família, homossexualismo, opressão, liberdade, fome, amor, ódio, guerra, paz, arte, vida, morte.

sexta-feira, 5 de agosto de 2011

Nelson Jobim: o "Pinheiro Machado" que não vingou (fantasia minha ou dele?)





Muitos acham que o Nelson Jobim foi e é - ainda - um homem de sorte, por sua relativamente longa e incansável trajetória política.Vejamos, a seguir.

Advogado na "Província" até meados dos anos 1980 - pois atuava no interior do Estado, ali na cidade de Santa Maria, sua terra natal -, Jobim foi convidado pelo amigo João Gilberto, então deputado federal pelo PMDB do Rio Grande do Sul, a disputar a eleição seguinte - a de 1986, justamente a que elegeria os constituintes para a ANC - Assembléia Nacional Constituinte -, pois o combativo e prestigiado João Gilberto - da linha de frente do antigo MDB, e depois do PMDB, na luta contra a ditadura -, embora ainda relativamente jovem, sentia-se cansado, da vida parlamentar; da distância da terra natal; de Brasília...

Topando a parada, o também ainda jovem Nelson Jobim, com o forte e decisivio apoio do amigo João Gilberto foi eleito deputado federal e veio para Brasília no início de 1987, como constituinte. Então, aqui ele se destacaria no Parlamento, e também na Constituinte.

Prestigiado pela cúpula do seu PMDB e por determinados e influentes parlamentares e constituintes eleitos por outros partidos, logo Nelson Jobim estava "escrevendo" a nossa Carta Política. Sim, como um de seus relatores, ele "escreveu" a atual Constituição Federal, inclusive inserindo na mesma determinados artigos na "calada da noite"(além de indispensáveis - se bem lembro, o art.2º foi um deles -, até que não são ruins, mas não podia...), como o próprio viria confessar tempos depois, quando encontrava-se como ministro do Supremo Tribunal Federal.

Mas embora relator prestigiado, Jobim não pode presidir a ANC, pois tinha o "velho" Ulysses - um gigante político, que o ofuscava -; o tb ...grande Mário Covas... Tempos depois ele virou ministro da Justiça, no primeiro mandato do FHC, donde saiu para o STF, e dessa Corte, após uns tantos anos, de lá saiu e "desceu" para "virar" ministro da Defesa do Lula.

Até alí uma respeitável trajetória política, né? Não para as grandes - e por que não dizer legítimas? - aspirações de Nelson Jobim. É que até hoje ele não foi governador do seu querido Rio Grande(hoje governado pelo Tarso Genro, o "el vermelho", ou melhor o "gauche", também conhecido como "Pangarezinho Gaúcho"); também não foi senador e muito menos presidente da República.

Isso aí não foi o pior, eis que faltou o principal: o Nelson Jobin não é e nunca foi o senador Pinheiro Machado, o maior de todos os caudilhos dos Pampas - há quem o veja, em certos aspectos, até maior que o Getúlio, levado à tragédia do suicídio, enquanto o outro não morreu pelas próprias mãos, pois foi assassinado no Rio por um popular - "Manso de Paiva -, na recepção de um renomado hotel, sob a alegação de que o senador era "a fonte de todos os males da República - na "República Velha".

Sim, o senador Pinheiro Machado, ao tempo em que segurava/sustentava, também "fazia e desfazia" presidentes da República, chegando ao ponto de derrotar pela última vez, com um candidato de muito pouco apelo político e popular, o "gigante" Rui Barbosa. Pela mídia de então, e até por certa historiografia, ele era considerado o o "árbitro da verificação dos poderes"(isso pode; isso não pode...). E o Jobim, seu inconfessável admirador, sempre desejou ser o Pinheiro Machado, mas não pode ser por que hoje o Brasil é outro, não pelo PT, óbvio, nem também pelo Lula, mas pelo próprio povo brasileiro e por suas instituições(inclusive pela Carta que o Jobim ajudou a escrever).

Então é isso: o Brasil é outro, bem outro, e o Jobim não pode reproduzir o poder incontestável que no passado teve o senador Pinheiro Machado - "o árbitro da verificação dos poderes". Jobim também não pode, nem poderá imitar outro gigante - "grandão" como ele - , mas da política internacional: Charles de Gaulle - o guru etéreo do Sarkozy, aquele que iria nos vender os "caças". Sim, de Gaulle, o general que salvou a honra da França, lutando contra Hitler e os seus compatriotas traidores, à frente dos quais estava o marechal Petáin.

Aí, portanto, entre o caudilhismo do general e senador Pinheiro Machado, e a grandeza moral e política daquele que foi o maior líder francês no século XX, a colossal frustação do nosso Nelson Jobim, que agora "vive cagando" para o mundo, e de hoje em diante longe do "Dilmão" e de sua sombra - o "barbudinho" de Garanhuns, que um dia foi presidente da República -, mas próximo do seu querido amigo Serra; do FHC..., inclusive fisicamente, tanto que por último adquiriu um apartamento em São Paulo, no bairro dos Jardins.

Mas agora é muito tarde para nós termos no Brasil um novo Pinheiro Machado, mesmo que ele fosse carismático e cosmopolita, a um só tempo, como o general De Gaulle.

quinta-feira, 4 de agosto de 2011

A última encarnação de Borba Gato(Capítulo X - O retorno de Raquel)

Decorridos sete anos de casamento, praticamente -
pois faltava um mês, apenas, para aquele fatídico aniversário, como ainda hoje é tido entre alguns crentes de diferentes matizes o temido setênio, que traria para a tradicional união uma crise cabalística junto com o número, Raquel e Gilberto encontravam-se tal e qual dois irmãos adultos que dividiam
uma mesma e única moradia. Estudiosa de filosofia à maneira clássica, no entanto, ela não fazia o tipo fácil e comum que arriscava-se em aventuras e buscas distantes dos parâmetros rígidos daquele conhecimento, como os que dali saem e voltam-se pelos caminhos incertos e duvidosos do saber, tão somente por se acharem atraídos ou guiados pela fé - qualquer fé, que os leva a experiências exóticas e desconhecidas. Não,a gêmea loira não era supersticiosa nem aventureira nas coisas da cabeça, mas o que havia nesta fora daquilo que foi convencionado chamar-se de racional e que partia para o campo lá bem demarcado, ampla e vastamente, da libido, a poderosa e sempre enigmática libido, que todos possuem - em uns mais exposta, em outros menos -, era o que vinha a ser a própria razão de sua vida. Com o marido, exclusivamente, todavia, essa razão submergia.

Gil, na verdade, desde que casou-se com Raquel
jamais a atendeu plenamente como homem, mas isso não a
impediu de ter com ele outras grandes alegrias e satisfações, que o casal encontrou através de uma convivência peculiar e de características específicas. A mesma baseava-se na confluência de aspectos complementares existentes nos temperamentos dos dois, que a vida na fazenda evidenciaria de forma extremamente benéfica e positiva, embora de um
modo paradoxal e surpreendente, na medida em que
contrariava aqueles prognósticos simples e fáceis, vez que o percurso do entendimento seria feito também pela via difícil da superação de muitas contradições, que os levaria a passar por cima de todas as suas diferenças e idiossincrasias. Como decorrência desse providencial processo, marido e mulher estabeleceram um pacto implícito e silencioso de bem viver que incluía uma tolerância absoluta, mas velada, em relação
às incursões que ela desenvolvia na busca de realização dos desejos mais íntimos e profundos que sentia.

Logo que fixou-se induvidosamente nas mentes de Gil
e Raquel a concepção afinada e simultânea de que haveria
entre eles um ajuste daquela natureza, ela deixaria de
dissimular e de tentar esconder encontros como os que ainda mantinha de tempos em tempos com Adão, em Brasília, e mesmo os rotineiros, como os que há muito vinha tendo com o tratador de cavalos, nos fundos da fazenda. Destes, aliás, a gêmea loira, na realidade, já desistira na semana anterior à do início do mês que faltava para completar o setênio conjugal,
simplesmente por inteiro e genuíno abuso que tomou da
pessoa – o peão que cuidava dos eqüinos, isso de uma forma tal que nem a própria força dos seus instintos, com todas as necessidades que tinham – que não eram poucas, a levariam a retomar o relacionamento, por mais breve e fugaz que fosse o retorno. Aquilo era devido, única e tão somente, à tardia constatação de que o parceiro habitual era desprovido de um
cérebro apto e versátil para conduzi-la pelos caminhos que a transportariam aos verdadeiros destinos dos melhores prazeres e êxtases da vida, como fazia-lhe o cunhado.

O que estava impelindo Raquel à decisão de deixar a
fazenda e o marido, portanto, nada tinha a haver com coisas ligadas ao universo do misticismo e de suas alegorias, muito menos a razões concretas, mas subjetivas, como as que provinham do decurso de supostos desgastes das relações matrimonias ao cabo de certo tempo de convivência.

Não, a mulher de Gil partiria apenas para buscar reviver com o exnamorado e eventual amante as relações que anteriormente estabeleciam-se com mais assiduidade e constância, apesar da irmã e da mãe por perto. Na mente da gêmea loira, assim, o fim da distância que a separava de Adão resolveria todas as necessidades do feminino que manifestava-se profunda e fortemente no seu íntimo, do qual sentia vir exigências bem maiores que antes, especialmente no tocante à qualidade daquilo que esperava receber de um homem; então, as expectativas ali existentes eram as de uma bela e exuberante balzaquiana que, embora sem exibir no rosto e no corpo - que ainda aparentavam vinte e poucos anos -a nova condição, sabia o que pensava e o que queria da vida, pois o sereno e maduro olhar que fitava esta, a única inversão na sua sugerida juventude, assim o dizia.

quarta-feira, 3 de agosto de 2011

Nas sombras do Poder - Capítulo VII

Malú, nem por uma ínfima fração de segundo, jamais,
em tempo algum, poderia conceber o que Martino e Sílvia
faziam na tarde em que ela os deixou para visitar a amiga
Antônia. Maria Lúcia sabia muito bem – ou pensava que sabia
– quem era o amante que tinha, pois conhecia-o desde a
idade que hoje era a da filha – 17 anos –, mas daí que ele
fosse relacionar-se sexualmente com esta?! Não, isso vinha
a ser uma descartada possibilidade em seu senso. Mas ali
estavam os dois, um cara de 51 anos e uma garota de 17,
amando-se com uma intensidade e uma libido que a mãe
nunca poderia imaginar. Tino, seu amante, transando com a
sua filha.

"Nas Sombras do Poder (Editora André Quicé, 2005)"

Autor: Láurence Raulino
Editora André Quicé, 2005
ISBN: 8585958340

Nas sombras do poder - Capítulo VI

A idade e os compromissos realmente mudam o
homem, pensou Tino, enquanto descia pelo elevador a
caminho da garagem, junto com Sílvia, ali a sós com ele,
disponível a um coroa, como todos há muito já o viam, sincera,
irresponsável e loucamente, e que outros dariam tudo para
ter ao lado – como o próprio, no passado –, mas que no
momento era dispensada e temida, como o são as coisas
perigosas e destrutivas que, não poucas vezes, põem-se à
frente das pessoas vida afora. Que desperdício, meu deus! –
diria Martino Lykon, em pensamento.

"Nas Sombras do Poder (Editora André Quicé, 2005)"

Autor: Láurence Raulino
Editado por Thesaurus Editora
ISBN: 8585958340