quarta-feira, 13 de junho de 2012

Reflexões à toa...







Láurence Raulino(*)



O Nada, após a morte, destino provável de todos nós, na real, se constitui em verdadeiro carrasco das melhores fantasias e esperanças humanas, daí a necessidade que temos de Deus(invenção do homem pré-histórico, que por "Ele" não foi criado, portanto, ao contrário...), da fé - de qualquer fé... -, creações originárias da pré-história e refinadas ao longo dos séculos da história pelas doutrinas, igrejas, academias..., tudo para não sucumbirmos na primeira esquina da vida. No fundo das nossas mentes, bem no fundo..., contudo, desconfiamos que essas "válvulas de escape" não passem de loucuras coletivas e individuais, consentidas pelo senso comum para permitir que a vida prossiga em seus altos e baixos, e quase sempre guiada pela racionalidade média, essa que nos faz suportá-la e nos mantém distantes de pensamentos nefastos como o do nosso provável destino, na real.

Ainda para tentarmos escapar de pensamentos nefastos como esse simbolizado e centralizado em nosso provável destino, após a morte, nós tomamos distância do caos e nos voltamos para a alta racionalidade, e assim procuramos dirigir as nossas vidas com planejamento, baseado no conhecimento, na ordem e na disciplina, o que não poucas vezes nos afasta da poesia e de todas as artes, de modo geral(com as quais podemos amenizar a tragédia da existência, sem fuga, como fazemos pelo caminho da religião), quando somos levados à ilusão infantil da permanência, da perenidade..., como se com a mesma - a racionalidade - pudessemos viver ao menos 100, 200, 300 anos a mais, ou até mesmo pela/na eternidade física, neste mundo - o real e que conhecemos, ou tentamos conhecer. No entanto, quem vive ou procura viver racionalmente, cedo ou tarde também morrerá, óbvio, igualmente ao desorientado, ao imprevidente..., ao perdido no senso comum pelos caminhos e armadilhas da vida.

Dentro daquele propósito de por ordem e disciplina nas nossas vidas, ao lado ou distantes da ciência temos pensado a politica, o que nos levou a planejá-la mais intensamente nos últimos cem anos, isso ao ponto de construirmos sistemas pretensamente racionais e justos, como os socialismos, o comunismo..., livres das injustiças e contradições burguesas, mas todos, por força e pela força destas, imagina-se, restaram no chão, o mesmo destino de outros sistemas iguais ou similares que ainda poderão vir, para por fim à liberdade individual e impor o coletivismo maldito e imbecil, ilusão religiosa - como diria o estigmatizado, mas lúcido e polêmico Roberto Campos - e nefasta à nossa ainda curta existência, como tantas outras.

Similinarmente à arte - ou às artes -, mas com as suas óbvias peculiaridades, o amor é das poucas experiências humanas que nos permite transcender e caminhar ao encontro de nós mesmos, ao contrário do percurso religioso, que é caminho de fuga da realidade e de desencontro com o nosso eu, pois pura alienação e subordinação insana e primitiva, só justificável pelo desespero com a inescapável certeza da morte. Mas o amor é capacidade humana - sim, não divina, como suposto pela fé - restrita e limitada, pois amamos apenas e verdadeiramente os nossos pais, filhos, mulheres..., nunca a coletividade, daí o equívoco, por exemplo, do projeto cristão, que mostrou o seu completo fracasso ao longo de vinte séculos justamente por supor e mandar o contrário, ou seja, "amai ao próximo como a ti mesmo." Amamos o próximo e ao próximo que nos é próximo, simplesmente, ao contrário do equívoco da hipocrisia cristã.

Na coletividade, o que podemos e devemos fazer com o/ao próximo é respeitá-lo, em nome da ética e da moralidade, mas ambas não são de fundo religioso, embora exista desde tempos imemoriais essa grave confusão existencial. Sim, a ética e a moralidade humanas, que edificaram o humanismo laico, fundam-se no respeito e na consideração à própria condição humana, constituída desde a origem do ser inteligente, sensível e autônomo que se forma na individualidade, que por isso mesmo impõe a todos as regras da ética e da moralidade. Eis o que basta para a vida civilizada, ainda um processo inacabado e a ser construído como um desafio diário e permanente.

(*) - advogado, articuista e escritor

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