quarta-feira, 28 de setembro de 2011

Capitão Francisco Raulino

Por Carlos Dias(*)

“A 20 de setembro [...] de 1891, transportou-se de Alto Longá para os Altos o Capm. Francisco Raulino da Silva, estabelecendo-se com a primeira loja de fazendas nacionaes e extrangeiras e outras mercadorias, extendendo o seu commercio em compras de gênero de exportação, no que foi imitado por outros, vindos depois, e lhe abriram competencia commercial.” (Dr. Alfredo Gentil de Albuquerque Rosa, em 16.12.1922)


Neste mês de setembro de 2011 faz 120 anos da chegada ao território - que depois se constituiria na cidade de Altos - de uma das personalidades mais influentes nos campos econômico, político e social: o Capitão Francisco Raulino da Silva.

Provinha ele da vizinha vila de Humildes, hoje Alto Longá, onde igualmente prestou larga folha de serviços àquela comunidade. Possuía aguçado tino para a política e o comércio. Era de uma força indomável quando se direcionava na conquista de algum ideal.

Tinha a patente de Capitão da Guarda Civil Nacional, título concedido pelo governo republicano, que dava ao seu portador prestígio e influência política na comunidade.

Origem, primeiro casamento e descendência

Francisco Raulino da Silva era natural da vila cearense de Tauá, onde nasceu a 31 de maio de 1848. Foi casado em duas núpcias, sendo a primeira com Damiana Mendes da Silva, natural de Alto Longá, local onde viveram por longos anos e onde nosso personagem enviuvou no ano de 1870. Da união nasceu uma única filha: Damiana Raulino da Silva, falecida em 1902.

É dessa união que descende outro importante segmento da família Raulino, do qual provém o Coronel Gervásio Raulino da Silva Costa (1895-1986), seu neto; empresário e político, proprietário da GECOSA, ex-Prefeito de Barras (1925-1928; 1930-1931), onde foi também presidente do Conselho Municipal (Câmara de Vereadores); seu filho Gervásio Costa Filho, bisneto do Capitão Francisco Raulino, foi prefeito de União-PI (1993-1996); Ezequias Gonçalves Costa (1919-2005), seu bisneto, advogado, industrial e político, Vereador em Miguel Alves, Deputado Estadual (1951-1958) e Deputado Federal (1963-1971); Nelson Nery Costa, seu trisneto, advogado, jurista, escritor, Defensor Público na Procuradoria Geral do Estado do Piauí, ex-presidente da OAB-PI e professor da Universidade Federal do Piauí; João Henrique de Almeida Sousa, advogado, escritor e político, foi Secretário de Governo (1987-1988), Secretário de Cultura (1988) e Secretário de Educação do Piauí 1988-1990), Deputado Federal (1991-1995; 1995-1999; 1999-2003) e Ministro dos Transportes, Secretário de Governo da Prefeitura de Teresina.

Funções públicas em Alto Longá

Ainda em Alto Longá, Francisco Raulino da Silva exerceu importantes funções públicas: Inspetor Literário da Província do Piauí, nomeado por ato de 05.12.1880; Conselheiro (Vereador), ocupando a presidência e sendo Procurador da Câmara; e membro da Comissão de Socorros, entidade que atendia os flagelados da seca. Foi também comerciante.

Segundo casamento e descendência

Sua segunda união ocorreu ainda em Alto Longá, com Ana Francisca da Silva, nascida em 1855. Era filha de Francisco Freire da Silva e Ana Cordolina de Sousa. Donana Raulino, como era conhecida, faleceu às 09:00 h da manhã do dia 26 de fevereiro de 1935, de nefrite crônica, após receber assistência médica. Foi sepultada na mesma data no cemitério público de Altos, conforme declaração prestada por seu filho, Coronel Ludgero Raulino da Silva e as testemunhas Roberto Alves da Costa e José dos Santos e Silva, que afirmaram no mesmo assento de óbito ser a mesma alva, piauiense e doméstica.

Do enlace do Capitão com Donana nasceu o filho Ludgero Raulino da Silva (26.03.1875-29.11.1954). Este chegou em Altos com 16 anos e 5 meses, acompanhado dos pais, auxiliando-os nas atividades comerciais no então povoado de São José dos Altos de João de Paiva. Com a criação da Agência Postal Telegráfica, em 1896, foi nomeado administrador, tornando-se seu primeiro agente. Foi Inspetor de Ensino (1904) e Juiz Distrital de Altos (1922).

Devido ao prestígio e à influência social na cidade, tornou-se um poderoso líder político, herança que deixou aos descendentes. Casou-se, por volta de 1899, com Honorina Vasconcelos Raulino, com quem teve os seguintes filhos: Ana Rosa (1900-1965), Francisco (1901-1975), Laudelina (1902-1970), Mário (1904-1964), Laurindo (1907-1985), Clóvis (1909-1939) e Adail Raulino.

De sua numerosa descendência, muitos alcançaram projeção política e social, desempenhando importantes funções públicas:

- Ana Rosa Raulino de Vasconcelos foi professora da Escola Mista de Altos (1922);

- Francisco Raulino foi comerciante e político; quatro vezes Prefeito Municipal de Altos (01.01.1929-04.10.1930; 17.11.1945-08.04.1946; 21.04.1948-31.01.1951; 31.01.1959-31.01.1963).

Dentre seus filhos, destacam-se: Washington Francisco Raulino, advogado e escritor; Ludgero Raulino da Silva Neto Raulino, médico, Professor de Farmacologia na UFPI, Deputado Federal (1979-1983; 1983-1987) e Secretário do Trabalho e Ação Social do Piauí (1978); Roberto Couto Raulino, Deputado Estadual por 04 legislaturas (1963-1967; 1967-1971; 1971-1975; 1975-1979).

- Mário Raulino foi Juiz Distrital e Deputado Estadual do Piauí (28.04.1947-31.01.1951). Dois de seus filhos foram prefeitos de Altos: Felipe José Mendes Raulino, o Felipão (03.02.1977-31.12.1982) e Elvira Mendes Raulino de Oliveira (01.01.2001-31.12.2004); seu filho José Raulino foi Capitão do Exército Brasileiro; Mário Raulino Filho foi Secretário Municipal de Saúde de Altos, é médico e professor universitário.

- Laurindo Raulino foi professor, literato, intelectual e magistrado; membro-fundador do Cenáculo Piauiense de Letras (1927), Juiz de Direito em Altos, Piripiri, São Miguel do Tapuio e Teresina; Corregedor de Justiça do Piauí. Destacam-se entre seus filhos: Laurindo Raulino Filho, médico, anestesista e proprietário da SAER; Láurence Ferro Gomes Raulino, advogado, procurador do INSS-SP; e Paulo Vinícius Ferro Gomes Raulino, engenheiro civil.

- Adail Raulino foi um dos pioneiros de Brasília, onde manteve atividade comercial.

Participação nos melhoramentos do povoado

Ao chegar a Altos, em 20 de setembro de 1891, Francisco Raulino da Silva comprou de João de Paiva Oliveira lotes de terra onde hoje se localiza o centro da cidade. Estabeleceu-se com o primeiro comércio, uma loja de tecidos nacionais e estrangeiros e outras mercadorias, iniciando também a exportação de peles, cera de carnaúba e algodão.

Em 1892, construiu a primeira casa de telhas do lugar, que contava à época apenas com nove casas, todas cobertas de palha. Esta residência, ainda existente, é aquela que integra também a Drogaria São Francisco (Farmácia da Fransquinha), onde sua esposa Donana também manteve por longos anos uma botica. Na casa, localizada na Avenida Francisco Raulino, 1781, atualmente reside a professora aposentada Honorina Couto Raulino Soares (Naná), bisneta de Francisco Raulino da Silva.

O Cônego Honório José Saraiva, Vigário Geral Forense da Paróquia de Nossa Senhora do Amparo, de Teresina, de 1883 a 1903, muito fez pelo povoado no início de sua formação. Contando com a ajuda da população, principalmente de João de Paiva Oliveira e Francisco Raulino da Silva, levantou em 1891 a primeira capela de São José.

Em 1892 o Capitão Francisco Raulino consegue do governo do estado a instalação da Coletoria Estadual em Altos, destinada à arrecadação de tributos para o Estado. Em janeiro do ano seguinte, usando de seu prestígio junto ao Governador Capitão Coriolano de Carvalho e Silva, obtém a vinda do primeiro destacamento policial para a povoação. É do mesmo governador que ele vai conseguir em 1894 uma verba de nove contos de réis, encarregando-se de mandar perfurar um poço público e a construção de um açude para abastecer a população. O açude foi feito sob a orientação do engenheiro Tenente-Coronel Manoel da Costa Teixeira.

Funções públicas em Altos

No ano de 1893, por portaria de 04 de janeiro, assinada pelo Governador Coriolano de Carvalho e Silva, é feita a nomeação do cidadão Francisco Raulino da Silva, para o cargo de Coletor das Rendas Estaduais em Altos.

Em 24 de agosto de 1894 é nomeado Inspetor de Ensino, em ato assinado pelo mesmo Governador, de acordo como livro de Portarias 351, n°11, de Cartas e Títulos. Eis, na íntegra, sua portaria de nomeação:

“O Governador do Estado, sob proposta do Dr. Director Geral Interino da Instrucção Pública, nomeia o cidadão Francisco Raulino da Silva para o lugar de Inspector do Ensino da povoação dos Altos.

Communique-se.

Palácio do Governo do Estado do Piauhy. Theresina, 24 de agosto de 1894.
Coriolano de Carvalho e Silva.”

Atividade política

Homem de aguçada inteligência e inclinado para a política, passou a exercer importância na vida social do antigo povoado de São José dos Altos. Logo de início, passou a disputar território político com João de Paiva Oliveira, o primeiro desbravador e fundador da cidade.

No texto Genealogia dos Costas, uma carta sem data deixada a seus filhos por Gervásio Raulino da Silva Costa, contando suas origens e sua saga, e publicada nas páginas 61 a 66 do livro Ezequias Gonçalves Costa: 85 anos de uma vida digna, editado em segunda edição no ano 2005, o Coronel Gervásio dá o seguinte depoimento sobre seu avô materno:

Francisco Raulino em política militou sempre nas fileiras do Partido Liberal, chefiando algumas vezes e sempre muito conceituado pelos chefes da Capital. Na República, porém, foi um revoltado, devido a ação de Governos arbitrários, tendo por isso lhe sido dado a alcunha de Vulcão pelo saudoso político e parlamentar Anísio de Abreu; por essa razão passou a militar no Partido Democrata, chefiado pelo Barão de Castelo Branco, Clodoaldo Freitas e outros, até a dissolução [do mesmo], recolhendo-se depois à vida privada, cuidando exclusivamente de seu comércio até sua morte em 1905. (COSTA, 2005, p. 66).

Ferrenho opositor e crítico do governo da época, o Capitão Raulino foi vítima em 1900 da famigerada Comissão de Verificação dos Poderes, organismo criado pelo governo federal para vencer sempre nos pleitos eleitorais, fortalecendo a política dos governadores. O objetivo desta comissão era fazer a “degola”, após examinar as atas das eleições, dos candidatos oposicionistas que tivessem vencido as eleições.

Julgando-se eleito Deputado Estadual para a legislatura de 1900 a 1904, juntamente com Antônio Costa Araújo, Firmino de Sousa Martins, Inocêncio de Arêa Leão, João José Batista, José Antônio de Santana, José de Lobão Portela, José Liberato Pereira de Araújo, José Luís Pereira, José Melins da Silveira Rios, Manoel Lopes Correia Lima, Raimundo Nonato da Cunha, Silvínio C. de B. Fontenele e Trasíbulo de Carvalho e Silva organizou um violento protesto no dia 01 de junho de 1900 contra o governador Raimundo Arthur de Vasconcelos, que os impedia de tomar posse naquela terceira legislatura republicana. Não teve jeito; nenhum deles assumiu o mandato legislativo.

Trágico fim

O que se sabe depois é que nosso personagem entrou em uma disputa comercial no ramo de fiação de tecidos com José de Almendra Freitas, da vila de Livramento, hoje José de Freitas. O produto sofrera uma enorme desvalorização, com a queda de preço, dada à sua grande oferta no mercado estadual e nacional, porquanto muitos já se dedicavam ao cultivo em larga escala.

Tendo perdido a concorrência, já com a desilusão política e antevendo uma possível ruína financeira, um dia o Capitão Raulino adentrou em seu quarto e num lance de desespero cometeu suicídio, disparando contra o próprio ouvido no ano de 1905.

Está sepultado no mausoléu da família, no cemitério São José de nossa cidade, sem nenhuma placa ou inscrição que lhe identifique ou destaque a memória.

Personagem de livros da historiografia piauiense e altoense

Além da obra anteriormente mencionada, figura como verbete no Dicionário enciclopédico piauiense ilustrado: 1549-2003, de Wilson Carvalho Gonçalves, e é citado, dentre outros, no livro O poder legislativo do Piauí: síntese histórica, de A. Tito Filho, publicado em 1980, além de alguns compêndios da historiografia altoense, como Altos, passado e presente, de Toni Rodrigues (1992), Cotidiano & memória, de Chiquinho Cazuza (1995), Câmara Municipal de Altos: memória histórica (2004) e Na fé da minha Paróquia, ambos de Carlos Alberto Dias, autor deste artigo.

Homenagem póstuma

Seu nome foi dado à principal artéria da cidade: Avenida Francisco Raulino. Depois nomeada de Avenida Getúlio Vargas na década de 1930, readquiriu em fins dos anos 40 a antiga denominação, por proposição do vereador Athayde da Cunha Mendes, que lhe fez inspirado louvor na sessão da Câmara Municipal de Altos em 31 de maio de 1948, ocasião em que o Capitão Raulino completava seu primeiro centenário de nascimento.

(*) - professor e pesquisador(Edição Portal Altos, seguinte: http://www.portalaltos.com.br)

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